ILHA DA CHAMPRONA
“FORTALECIMENTO
DE UMA IDENTIDADE QUILOMBOLA”
“A gente permanece
sempre querer ser quilombo, e somos quilombos, porque, como lhe disse [a
história narrada], nós vivemos no lugar de quilombo, como quilombo [escravo]. E
hoje nós queremos esse reconhecimentos, porque nós dependemos dessa
propriedade, nós estamos cercado, não tem pra onde nós ir, nós estamos querendo
essa propriedade [reconhecimento enquanto comunidade quilombola]. Nós estamos
lutando por causa dessa propriedade[1]
A comunidade da Ilha da Champrona busca, através de relatos orais, ser reconhecida pela Fundação Palmares como um povo
remanescente dos quilombos, estes constituídos ao longo do tempo em várias
partes do território brasileiro. A ilha da Champrona fica localizada na cidade
de Xique-Xique, Bahia à 688 km da capital Salvador.
Depois de muitas lutas e resistência contra a escravidão
e as tristes heranças deste passado histórico, os remanescentes quilombolas da ilha da Champrona se
auto reconhecem como descendentes das pessoas que vieram da África e foram
terrivelmente escravizadas no Brasil.
Hoje, com conhecimento sobre a história das lutas dos seus antepassados, as horas trabalhadas e o sangue derramado na construção da pátria brasileira, os moradores desta comunidade fortalecem a sua identidade negra, veem a sua descendência como uma qualidade essencial e busca autenticá-la perante as leis.
Hoje, com conhecimento sobre a história das lutas dos seus antepassados, as horas trabalhadas e o sangue derramado na construção da pátria brasileira, os moradores desta comunidade fortalecem a sua identidade negra, veem a sua descendência como uma qualidade essencial e busca autenticá-la perante as leis.
As histórias narradas pelos moradores mais antigos da
comunidade adquirem sentido quando comparadas a história dos africanos no Brasil. A
luta pela sobrevivência, a partir do momento em que estes conquistaram a
liberdade, se deu nos quilombos, esta ganha sentido quando grupo étnico tem cunho identitário, com isso as diferenças se fortalecem nas comunidades quilombolas.
[1] Pelo contexto histórico, a propriedade é de pertencimento da comunidade, que se auto reconhecem remanescentes de quilombo.
AS LAVADEIRAS
DE GERAÇÃO À GERAÇÃO
LOCAL DA MEMÓRIA
CASA DE FARINHA
A gente já vem com
este ‘bucado’ de ano[1] que já vem do meu pai,
que já trouxe de lá esta casa de farinha [tradição] e foi a coisa que ele mais
me pediu, pra não deixar essa casa de farinha acabar [essa tradição
acabar]. ‘Manele e já tô com 77 e poucos
anos, eu sei que não vou ficar aqui, vou ter que me separar de vocês, não deixe
essa casa de farinha cair, ela é criar meus netos é o lugar[2] dos meus netos.’ Ele
queria deixar uma tradição para os meus netos verem e para os netos dele vê.
Ela tá aqui de taipa, tô pedindo a Deus para ano que vem colocar uns calços
nela aqui, porque ela não tá boa.”
Manuel Chumbada - 71 anos
[1]
Pela lógica a história narrada se passa na época dos movimentos abolicionistas
e faz referências a introdução do “negro” à sociedade da época, repleta de
preconceitos e discriminações. Refugiar-se nos quilombos era única alternativa
para todos aqueles que estavam inseridos neste contexto.
[2]
Local da cultura, se torna uma permanência história repleta de significação e
valores imateriais da cultura de um povo.
MESTRES DA CULTURA POPULAR
"GRIÔS"
O saber conservado na memória dos griôs – pessoas que têm
o ofício de guardar e ensinar a memória cultural da comunidade. Estes ajudam a
compreender a história da comunidade, isto é, através das tradições orais, das
histórias preservadas por mais de um século são como cacimbas de ensinamentos,
pelas quais conseguimos entender a necessidade do reconhecimento.
MUITAS HISTÓRIAS SE PASSARAM DENTRO DESSA CASA DE FARINHA
Já tô 76 anos e
conheço de muitas coisas da tradição velha, aqui na casa de farinha não tem
mais a roda que a gente fazia as massas, hoje já não tem mais, com o tempo as
coisas vão mudando.
Antigamente a roda
era puxada no braço, a gente é que puxava passava a noite inteirinha puxando
roda
para ralar aquela massa pra fazer a farinha, de dia a gente ia tirar mandioca na
água, o dia todo na água e quando era de noite a gente ainda vinha pra cá (casa
de farinha) puxar a roda [...]
Alberto Ferreira da Cruz - 76 anos
COMUNIDADE FORTALECIDA POR UMA IDENTIDADE QUILOMBOLA
“Dentro da casa de
farinha era aquela alegria, era trabalhando e cantando a noite todinha, puxando
a roda e cantando.”
"Vou
me embora dessa casa oh piaba ê, oh piaba á, vou me embora desse mundo o piaba
ê, oh piaba á.
Era o samba da roda."
É O BATUQUE DA CAIXA...
...O SOM DO PANDEIRO
E O PISAR DOS PÉS NO TERREIRO DA SENZALA.
“A gente sendo
reconhecido lá fora, pode até ser que por esses meios, a gente acha meio de
alguém dá providência e que tome as providências de vir uma melhora, uma coisa
pra nos ajudar. É isso que a gente quer. Ser reconhecido.”
In memoriam Alberto Ferreira da Cruz
A COMUNIDADE
ASPECTOS CULTURAIS
Uma cultura repleta de significados, que ressaltam a
importância das contribuições africanas e afro-brasileiras. As experiências
compartilhadas ao longo dos anos ajudam a fortalecer uma identidade negra em
construção, as histórias narradas remetem a um passado histórico marcado pelo
preconceito e a inferiorização das comunidades quilombolas .
As histórias da ilha da Champrona adentram e permanecem como parte integrante da cultura nacional. Cultura essa expressada pelos mitos,
lendas, contos populares, samba de roda, reizados, são Gonçalo, capoeira,
benzedeiras, parteiras,lavadeiras, nos festejos de santos populares e tantas outras
manifestações, costumes e lições de vida que embasam esse pedido de
reconhecimento enquanto comunidade quilombola.
Hoje, se faz necessário fazer uso da palavra para
fortalecer esse pedido, dando ênfase as práticas essenciais desta comunidade. Na
cultura africana a palavra tem poder de ação, os discursos aqui ressaltados são
tidos pela comunidade como verdade como remete a cultura africana.
Uma comunidade que cultiva os elementos repletos de significados e valores comuns a um povo.
REFERÊNCIAS DA
PESQUISA
Pesquisa etnográfica realizada por Marquileide Oliveira,
graduada em Letra pela Universidade do Estado da Bahia _UNEB – 2007,
Pós-graduada em Estudos Linguísticos e Literários pela mesma Universidade, 2009.
Crédito das Imagens : Marquileide da Silva Oliveira (Markileide
Oliveira)
Celular: 74 99915 5330
FONTE BIBLIOGRAFICA
Mirian de Fatima Chagas. A
política do reconhecimento dos "remanescentes das comunidades dos
quilombos". Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832001000100009
Acesso às 14:30;.
Andreia Lisboa Santos, Ana Lúcia Silva Souza. Cantos
e re-encantos: Vozes africanas e afro-brasileiras. Cultura Popular e Educação,
2008.