sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

UMA BREVE VIAGEM NA HISTÓRIA DA ILHA DO MIRADOURO






Ilha do Miradouro




UMA BREVE VIAGEM NA HISTÓRIA DA ILHA DO MIRADOURO


Marquileide da Silva Oliveira[1]

Resumo: O presente artigo traz uma breve análise da história do primeiro núcleo populacional de Xique-Xique, Ilha do Miradouro. bem como, tenta esclarecer o desenvolvimento, a formação da comunidade e como foi construído a secular igreja de Nossa Senhora de Sant’Ana, refletindo, criticamente, a respeito de quem realmente pertence essas terras. Busca-se, ainda, a conscientização da importância dessa Igreja para a história, a necessidade da preservação, proteção e do reconhecimento como patrimônio cultural, material e imaterial do estado e da federação. O texto está embasado em pesquisas anteriores realizadas por importantes pesquisadores xiquexiquenses como Cassimiro Machado Neto (1999) e Carlos Souza Santos (2004),traz dados do IBGE e do Vale do São Francisco, entre outras fontes orais.

Palavras-chaves: Ilha do Miradouro; Nossa Senhora de Sant’Ana; São Francisco; Xique-Xique.


A cidade de Xique-Xique do estado da Bahia, situada a 590 km da capital Salvador, possui uma das mais linda e secular Igreja, construída entre os séculos XVI e XVII (não se sabe ao certo), tem como padroeira Nossa Senhora de Sant’Ana, está localizada na Ilha do Miradouro às margens do Médio São Francisco. Esta localidade, ainda hoje, preserva a memória e a tradição cultural de varias gerações.
Segundo dados do IBGE[2], o arquipélago, ao qual pertence à ilha do Miradouro, era habitado por varias tribos indígenas como as massacarás, as pontás, as aracajás e as amoipirás entre outras, que foram disseminados pela colonização. Foi em 1522, com o donatário da Capitânia de Pernambuco, Duarte Coelho Pereira, que se fundaram os primeiros povoados a margem do rio São Francisco. Só em 1549 com o desbravador Francisco Garcia Dias D’Avila[3] que se iniciaram o desbravamento do Vale do Médio São Francisco, colonizadores vindos de Recife, Olinda e da capital Salvador. Invadiram agressivamente uma natureza virgem, ou seja, habitat indígena, aprisionaram e escravizaram os índios a seu bel prazer, tudo isso a procura de riquezas e implantaram severamente os serviços para o criatório de bovinos.
De acordo com pesquisas realizadas pelo Vale do São Francisco[4], os primeiros núcleos de colonização se deram em Bom Jesus da Lapa à 796 km de Salvador. Mas, por toda região fundaram-se numerosas fazendas de gado que deram origem a outras aldeias e comunidades. No final do século VII a história registra uma grande fazenda de gado e um dos maiores e principal porto fluvial que abastecia o Médio São Francisco, conforme a pesquisa a citada fazenda ficava próxima à atual cidade da Barra, não afirmando o local exato. Os moradores mais antigos e alguns pesquisadores afirmam que tal porto é atual cidade de Xique-Xique. Esta foi uma grande fazenda que recebia o nome de Fazenda Praia, de propriedade de (Sebastião José de Carvalho[5] ou fidalgo português Theobaldo José Miranda Pires de Carvalho[6]), era, também, um importante porto fluvial onde aportavam vapores e grandes navegações. 
Foi, exatamente, neste período que se deu os primeiros núcleos populacionais da região onde está situado o município de Xique-Xique. Os colonizadores fixaram suas moradias, fundaram aldeias e comunidades ao redor do rio, ajudaram a povoar as terras descobertas. Segundo Santos[7] (2004) o sertanista Belchior Dias[8] e seu filho Robério Dias[9] foram os desbravadores deste municipio, motivados pela descoberta do ouro nas serras do Assuruá fixaram suas moradias na Ilha do Miradouro, já que de lá miravam o brilho do metal mais cobiçado e valioso dessas terras, o ouro. Com eles, provavelmente, vieram os negros e brancos, aos poucos a comunidade ia se miscigenando, ou seja, aderindo características das diversas culturas.  
O número de vilas aumentou devido à colonização, nesta época da história a presença da Igreja, na figura dos jesuítas, era constante. Existia a necessidade de catequizar, ou melhor, de evangelizar, já que se tratava das terras onde viviam os nativos, isto é, os índios. Então, nestas localidades era necessária a intervenção do poder religioso, foram construídas pequenas igrejas com arquiteturas belíssimas e ricas em detalhes, locais onde cultuavam a fé cristã. Na ilha do Miradouro, como já foi dito anteriormente, possui uma igreja com características advindas da colonização que cultuavam as tradições européias.
A capela onde se celebra a fé cristã, devotada a Senhora de Santana é o marco da história xiquexiquense. De acordo com os pesquisadores Carlos Santos (2004) e Cassimiro Machado Neto (1999) a data da edificação desse patrimônio material e imaterial continua incerta. Faz-se necessário datar o período exato da construção dessa Igreja tão importante para a história do Brasil e principalmente a história de Xique-Xique.
O pesquisador Carlos Santos diz que:
As construções das diversas igrejas em Olinda, do forte em Penedo, a fuga dos holandeses, o período histórico dado para a construção da capela, a forte presença, ainda hoje, da raça branca de aspecto físico diferente dos portugueses nas serras do Assuruá – são pontos coincidentes à espera de pesquisadores e antropólogos para deslindarem o mistério que envolve a verdadeira época da construção e a origem dos construtores da referida capela (SANTOS, p.14, 2004)
Ao longo dos anos, estas questões vêm provocando inquietações dos pesquisadores locais e dos estudiosos, de fato, são dados importantes para história desse lugar. O tombamento oficial da Capela Senhora de Santana localizada na Ilha do Miradouro como patrimônio material e imaterial da Bahia e do Brasil é uma grande conquista, a mesma está passando por o processo de restauração de toda sua arquitetura. Que pelos técnicos possuem uma beleza peculiar, digna de reconhecimento a nível nacional.
Em relação ao terreno onde foi construída a capela têm informações[10] de que dona Inácia Araujo Pereira, viúva do coronel Garcia D’Avila em 28 de março de 1768, passou em procuração para o capitão-mor José Rocha Medrado, o poder de promover a doação da Ilha do Miradouro, juntamente com a Capela, para que se tornasse patrimônio da gloriosa Santanta, isso foi efetivado em 26 de fevereiro de 1769. Só que na primeira metade do século XX, a Igreja do Miradouro quando administrada pela Diocese de Barra na figura do Bispo Dom Augusto Álvaro da Silva foi avisada que a ilha do Miradouro tinha sido vendida para Lithercilio Rocha[11] e, consequentemente o terreno da igreja faria parte da negociação. Houve, ainda, tentativas de invasões das terras da ilha do Miradouro baseado na legislação de que as ilhas pertencem, de direito, à Marinha e sendo da mesma é do Estado, dessa forma as terras pertencem ao povo ou daqueles que tiram dela o seu sustento.
Portanto, para o povo isso não fazia diferença, todos reivindicavam o direito de reverenciar e venerar à imagem milagrosa de Senhora de Santana. Os devotos mantinham a fé cristã  e a convicção religiosa tinha grande força naquela época, tão grande, que as terras onde foram construída a igreja ainda é reconhecida como pertencente a Santa, para a comunidade o terreno pertence a igreja.
O próprio Lithercio Rocha nunca proibiu as visitas e o culto na igreja, ao contrário, ele incentiva e promovia com prazer os festejos. As tradições culturais, daquele período, continuam vivas, a cada dia 26 de julho celebra-se missa e procissão na Ilha do Miradouro, são demonstrações de fé bastante significativas, representadas na participação efetiva dos fiéis nas orações, nos louvores e no pagamento das promessas. O dia de Nossa Senhora de Sant’Anta tornou-se em verdadeira festa popular, onde é possível perceber o quanto a nossa cultura é rica e miscigenada, seja nas manifestações do povo, na comida, na bebida, na dança, no samba de roda, enfim, isso significa que recebemos as influências dos índios, dos negros e dos brancos. 
Portanto, a Igreja do Miradouro é o local da memória, onde é possível viver e reviver fatos importantes da formação de um povo é um lugar que necessita de preservação, de proteção e de reconhecimento. Simboliza a crença ,cultura, reflete histórias de vida e dá possibilidade de conhecer um pouco mais das gerações passadas. Trata-se de um bem cultural de natureza material e imaterial, já que nela se tem registros de festejos religiosos que marcaram e marca a vivência de um grupo. É na capela de Senhora de Santana que podemos encontrar uma das mais fortes manifestações da fé cristã, onde se concentram e se reproduz as práticas culturais. Faz-se necessário, preservar esse patrimônio cultural, entendendo que este lugar é o início da formação de uma sociedade organizada, para assim, evitar danos irreversíveis tanto na parte material como na imaterial da secular igreja. Buscamos com isso fortalecer o valor cultural que esse lugar e essa igreja representam na memória de nós brasileiros, baianos e xiquexiquenses, garantir, dessa maneira, a proteção e a preservação efetiva desses patrimônios. Finalizamos com as palavras de Cassimiro Machado Neto (p. 23, 1999).
“Passado mais de três século, o povoado da ilha do Miradouro permanece firme com sua capela, digna de ser tombada e preservada pelos órgãos públicos municipais, estaduais e federais, como patrimônio histórico! Aquele povoado é o marco mais significativo da gêneses Chique-chiquense”.
Senhora Santana do Miradouro
  
1ª Etapa da Restauração da Capela  - Técnicos do IPAC
Pescador Ribeirinho

Porto de desembarque na Ilha do Miradouro
 
Festejo de Senhora Santana do Miradouro
Ilha do Miradouro - Rio São Francisco
Casas de alvenaria









REFERÊNCIAS
CHAVES, Juarez. Festa de Santa do Miradouro.  Disponível em: http://xiquexiquense.blogspot.com/2010/07/cronica-festa-de-santana-na-ilha-do.html.
Acesso dia 28/09/2010 às 22:40.

Acesso dia 28/09/2010 às 00:13.
MACHADO NETO, Cassimiro. Senhor do Bonfim e Bom Jesus de Chique-Chique. Edição do Autor: Chique-Chique, Bahia, 1999.

OLIVEIRA, Markileide. Imagens. Arquivo pessoal: 15 de abril de 2010.

SANTOS, Carlos de Souza. Crônicas Xiquexiquíssima. Edição do Autor: Xiquexique, Ba, 2004.
Xique-Xique, Bahia, Histórico. Disponível em:
Acesso dia 28/09/2010 às 22:30.









[1] Graduada em Letras pela UNEB (2007), Especialista em Estudos Linguístico e Literários pela UNEB (2009), Pesquisadora dos aspectos culturais de Xique-Xique (desde 2006), Professora do Projeto Educação pela Arte (2009-2010), Coordenadora do Projeto Memoralidade (2010-2011).
[3] Francisco Garcia Dias D’Avila fidalgo português que acompanhou Tomé de Souza, penetrou no Vale do São Francisco ente 1549 e 1553, viajando no sentido contrário à correnteza do rio. ( MACHADO NETO, p. 19, 1999)
[6] MACHADO NETO, Cassimiro. Senhor do Bonfim e Bom Jesus de Chique-Chique. Edição do Autor: Chique-Chique, Bahia, 1999.
[7] SANTOS, Carlos de Souza. Crônicas Xiquexiquíssima. Edição do Audor: Xiquexique, Ba, 2004.
[8] “Belchior Dias foi outro chefe de expedição que exerceu importante papel de desbravador do interior da colônia.” (MACHADO NETO, p.20, 1999)
[9] “Robério Dias, filho de Belchior Dias com uma índia de nome Lourença, foi continuador do trabalho do pai.” (MACHADO NETO, p. 21, 1999)
[10] Dados do livro de Carlos Santos As crônicas Xiquexiquíssimas (2004)
[11] “Lithercílio Batista da Rocha, em todos os tempos de Xiquexique, foi um dos mais prósperos comerciantes de produtos regionais. [...] Foi Prefeito Municipal nos anos de 1939 a 1941”.(SANTOS, p.14, 2004)

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