Ilha do Miradouro |
UMA BREVE VIAGEM NA HISTÓRIA DA ILHA DO MIRADOURO
Marquileide da Silva Oliveira[1]
Resumo: O presente artigo
traz uma breve análise da história do
primeiro núcleo populacional de Xique-Xique, Ilha do Miradouro. bem como, tenta
esclarecer o desenvolvimento, a formação da comunidade e como foi construído a
secular igreja de Nossa Senhora de Sant’Ana, refletindo, criticamente, a
respeito de quem realmente pertence essas terras. Busca-se, ainda, a
conscientização da importância dessa Igreja para a história, a necessidade da
preservação, proteção e do reconhecimento como patrimônio cultural, material e
imaterial do estado e da federação. O texto está embasado em pesquisas
anteriores realizadas por importantes pesquisadores xiquexiquenses como
Cassimiro Machado Neto (1999) e Carlos Souza Santos (2004),traz dados do IBGE e
do Vale do São Francisco, entre outras fontes orais.
Palavras-chaves: Ilha do Miradouro; Nossa Senhora de
Sant’Ana; São Francisco; Xique-Xique.
A cidade de Xique-Xique do estado da
Bahia, situada a 590 km da capital Salvador, possui uma das mais linda e
secular Igreja, construída entre os séculos XVI e XVII (não se sabe ao certo),
tem como padroeira Nossa Senhora de Sant’Ana, está localizada na Ilha do
Miradouro às margens do Médio São Francisco. Esta localidade, ainda hoje,
preserva a memória e a tradição cultural de varias gerações.
Segundo dados do IBGE[2],
o arquipélago, ao qual pertence à ilha do Miradouro, era habitado por varias
tribos indígenas como as massacarás, as pontás, as aracajás e as amoipirás
entre outras, que foram disseminados pela colonização. Foi em 1522, com o
donatário da Capitânia de Pernambuco, Duarte Coelho Pereira, que se fundaram os
primeiros povoados a margem do rio São Francisco. Só em 1549 com o desbravador
Francisco Garcia Dias D’Avila[3]
que se iniciaram o desbravamento do Vale do Médio São Francisco, colonizadores
vindos de Recife, Olinda e da capital Salvador. Invadiram agressivamente uma
natureza virgem, ou seja, habitat indígena, aprisionaram e escravizaram os
índios a seu bel prazer, tudo isso a procura de riquezas e implantaram
severamente os serviços para o criatório de bovinos.
De acordo com pesquisas realizadas pelo
Vale do São Francisco[4],
os primeiros núcleos de colonização se deram em Bom Jesus da Lapa à 796 km de
Salvador. Mas, por toda região fundaram-se numerosas fazendas de gado que deram
origem a outras aldeias e comunidades. No final do século VII a história
registra uma grande fazenda de gado e um dos maiores e principal porto fluvial
que abastecia o Médio São Francisco, conforme a pesquisa a citada fazenda
ficava próxima à atual cidade da Barra, não afirmando o local exato. Os
moradores mais antigos e alguns pesquisadores afirmam que tal porto é atual cidade
de Xique-Xique. Esta foi uma grande fazenda que recebia o nome de Fazenda Praia, de propriedade de (Sebastião
José de Carvalho[5] ou
fidalgo português Theobaldo José Miranda Pires de Carvalho[6]),
era, também, um importante porto fluvial onde aportavam vapores e grandes
navegações.
Foi, exatamente, neste período que se
deu os primeiros núcleos populacionais da região onde está situado o município
de Xique-Xique. Os colonizadores fixaram suas moradias, fundaram aldeias e
comunidades ao redor do rio, ajudaram a povoar as terras descobertas. Segundo
Santos[7]
(2004) o sertanista Belchior Dias[8]
e seu filho Robério Dias[9]
foram os desbravadores deste municipio, motivados pela descoberta do ouro nas
serras do Assuruá fixaram suas moradias na Ilha do Miradouro, já que de lá
miravam o brilho do metal mais cobiçado e valioso dessas terras, o ouro. Com
eles, provavelmente, vieram os negros e brancos, aos poucos a comunidade ia se
miscigenando, ou seja, aderindo características das diversas culturas.
O número de vilas aumentou devido à
colonização, nesta época da história a presença da Igreja, na figura dos
jesuítas, era constante. Existia a necessidade de catequizar, ou melhor, de
evangelizar, já que se tratava das terras onde viviam os nativos, isto é, os índios. Então, nestas localidades era
necessária a intervenção do poder religioso, foram construídas pequenas igrejas
com arquiteturas belíssimas e ricas em detalhes, locais onde cultuavam a fé
cristã. Na ilha do Miradouro, como já foi dito anteriormente, possui uma igreja
com características advindas da colonização que cultuavam as tradições européias.
A capela onde se celebra a fé cristã,
devotada a Senhora de Santana é o marco da história xiquexiquense. De
acordo com os pesquisadores Carlos Santos (2004) e Cassimiro Machado Neto
(1999) a data da edificação desse patrimônio material e imaterial continua
incerta. Faz-se necessário datar o período exato da construção dessa Igreja tão
importante para a história do Brasil e principalmente a história de Xique-Xique.
O pesquisador Carlos Santos diz que:
As construções das diversas igrejas em
Olinda, do forte em Penedo, a fuga dos holandeses, o período histórico dado
para a construção da capela, a forte presença, ainda hoje, da raça branca de
aspecto físico diferente dos portugueses nas serras do Assuruá – são pontos
coincidentes à espera de pesquisadores e antropólogos para deslindarem o
mistério que envolve a verdadeira época da construção e a origem dos
construtores da referida capela (SANTOS, p.14, 2004)
Ao longo dos anos, estas questões vêm
provocando inquietações dos pesquisadores locais e dos estudiosos, de fato, são
dados importantes para história desse lugar. O
tombamento oficial da Capela Senhora de Santana localizada na Ilha do
Miradouro como patrimônio material e imaterial da Bahia e do Brasil é uma grande conquista, a
mesma está passando por o processo de restauração de toda sua arquitetura. Que pelos técnicos possuem uma beleza peculiar, digna de reconhecimento a nível nacional.
Em relação ao terreno onde foi construída
a capela têm informações[10]
de que dona Inácia Araujo Pereira, viúva do coronel Garcia D’Avila em 28 de
março de 1768, passou em procuração para o capitão-mor José Rocha Medrado, o
poder de promover a doação da Ilha do Miradouro, juntamente com a Capela, para
que se tornasse patrimônio da gloriosa Santanta, isso foi efetivado em 26 de
fevereiro de 1769. Só que na primeira metade do século XX, a Igreja do
Miradouro quando administrada pela Diocese de Barra na figura do Bispo Dom
Augusto Álvaro da Silva foi avisada que a ilha do Miradouro tinha sido vendida
para Lithercilio Rocha[11]
e, consequentemente o terreno da igreja faria parte da negociação. Houve,
ainda, tentativas de invasões das terras da ilha do Miradouro baseado na
legislação de que as ilhas pertencem, de direito, à Marinha e sendo da mesma é
do Estado, dessa forma as terras pertencem ao povo ou daqueles que tiram dela o
seu sustento.
Portanto, para o povo isso não fazia
diferença, todos reivindicavam o direito de reverenciar e venerar à imagem milagrosa
de Senhora de Santana. Os devotos mantinham a fé cristã e a convicção religiosa tinha grande força
naquela época, tão grande, que as terras onde foram construída a igreja ainda é
reconhecida como pertencente a Santa, para a comunidade o terreno pertence a
igreja.
O próprio Lithercio Rocha nunca proibiu
as visitas e o culto na igreja, ao contrário, ele incentiva e promovia com
prazer os festejos. As tradições culturais,
daquele período, continuam vivas, a cada dia 26 de julho celebra-se missa e
procissão na Ilha do Miradouro, são demonstrações de fé bastante significativas,
representadas na participação efetiva dos fiéis nas orações, nos louvores e no
pagamento das promessas. O dia de Nossa Senhora de Sant’Anta tornou-se em
verdadeira festa popular, onde é possível perceber o quanto a nossa cultura é
rica e miscigenada, seja nas manifestações do povo, na comida, na bebida, na
dança, no samba de roda, enfim, isso significa que recebemos as influências dos
índios, dos negros e dos brancos.
Portanto, a Igreja do Miradouro é o local da memória, onde é possível viver
e reviver fatos importantes da formação de um povo é um lugar que necessita de preservação, de proteção e de reconhecimento.
Simboliza a crença ,cultura, reflete histórias de vida e dá possibilidade de conhecer
um pouco mais das gerações passadas. Trata-se de um bem cultural de natureza
material e imaterial, já que nela se tem registros de festejos religiosos que
marcaram e marca a vivência de um grupo. É na capela de Senhora de
Santana que podemos encontrar uma das mais fortes manifestações da fé cristã,
onde se concentram e se reproduz as práticas culturais. Faz-se necessário,
preservar esse patrimônio cultural, entendendo que este lugar é o início da formação de uma sociedade organizada, para
assim, evitar danos irreversíveis tanto na parte material como na imaterial da
secular igreja. Buscamos com isso fortalecer o valor cultural que esse lugar e
essa igreja representam na memória de nós brasileiros, baianos e xiquexiquenses,
garantir, dessa maneira, a proteção e a preservação efetiva desses patrimônios.
Finalizamos com as palavras de Cassimiro Machado Neto (p. 23, 1999).
“Passado
mais de três século, o povoado da ilha do Miradouro permanece firme com sua
capela, digna de ser tombada e preservada pelos órgãos públicos municipais,
estaduais e federais, como patrimônio histórico! Aquele povoado é o marco mais
significativo da gêneses Chique-chiquense”.
Senhora Santana do Miradouro |
1ª Etapa da Restauração da Capela - Técnicos do IPAC |
Pescador Ribeirinho |
Porto de desembarque na Ilha do Miradouro |
Casas de alvenaria |
REFERÊNCIAS
CHAVES,
Juarez. Festa de Santa do Miradouro. Disponível em: http://xiquexiquense.blogspot.com/2010/07/cronica-festa-de-santana-na-ilha-do.html.
Acesso
dia 28/09/2010 às 22:40.
História. Disponível em: http://www.valedosaofrancisco.com.br/Cultura/Historia.asp
Acesso dia 28/09/2010 às
00:13.
MACHADO
NETO, Cassimiro. Senhor do Bonfim e Bom
Jesus de Chique-Chique. Edição do Autor: Chique-Chique, Bahia, 1999.
OLIVEIRA,
Markileide. Imagens. Arquivo
pessoal: 15 de abril de 2010.
SANTOS, Carlos de Souza. Crônicas Xiquexiquíssima. Edição do Autor: Xiquexique, Ba, 2004.
Xique-Xique, Bahia,
Histórico.
Disponível em:
Acesso
dia 28/09/2010 às 22:30.
[1] Graduada
em Letras pela UNEB (2007), Especialista em Estudos Linguístico e Literários
pela UNEB (2009), Pesquisadora dos aspectos culturais de Xique-Xique (desde
2006), Professora do Projeto Educação pela Arte (2009-2010), Coordenadora do
Projeto Memoralidade (2010-2011).
[2]
http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/bahia/xiquexique.pdf.
Acesso dia 28/09/2010 às 22:30.
[3]
Francisco Garcia Dias D’Avila fidalgo português que acompanhou Tomé de Souza,
penetrou no Vale do São Francisco ente 1549 e 1553, viajando no sentido
contrário à correnteza do rio. ( MACHADO NETO, p. 19, 1999)
[4]
http://www.valedosaofrancisco.com.br/Cultura/Historia.asp.
Acesso dia 28/09/2010 às 00:13.
[5]
http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/bahia/xiquexique.pdf.
Acesso dia 28/09/2010 às 22:30.
[6] MACHADO
NETO, Cassimiro. Senhor do Bonfim e Bom
Jesus de Chique-Chique. Edição do Autor: Chique-Chique, Bahia, 1999.
[7] SANTOS,
Carlos de Souza. Crônicas
Xiquexiquíssima. Edição do Audor: Xiquexique, Ba, 2004.
[8]
“Belchior Dias foi outro chefe de expedição que exerceu importante papel de
desbravador do interior da colônia.” (MACHADO NETO, p.20, 1999)
[9] “Robério
Dias, filho de Belchior Dias com uma índia de nome Lourença, foi continuador do
trabalho do pai.” (MACHADO NETO, p. 21, 1999)
[10]
Dados do livro de Carlos Santos As
crônicas Xiquexiquíssimas (2004)
[11]
“Lithercílio Batista da Rocha, em todos os tempos de Xiquexique, foi um dos
mais prósperos comerciantes de produtos regionais. [...] Foi Prefeito Municipal
nos anos de 1939 a 1941”.(SANTOS, p.14, 2004)
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